Guerres commerciales : Épisode II

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No nosso Editorial de março, destacámos os novos máximos atingidos pelas bolsas norte-- americanas e pelas cotações do ouro. Menos de dois meses depois, apenas o ouro continua a valorizar, isto porque o mundo entrou abruptamente num período de realinhamento económico global, marcado por ameaças tarifárias que se converteram numa guerra comercial internacional, ou melhor, num confronto singular que opõe os Estados Unidos ao resto do mundo. Uma evolução bem divergente das expetativas que a maioria dos investidores, e nós próprios, tínhamos para o corrente ano. 

VOLATILIDADE SEM PRECEDENTES NOS MERCADOS 

Desde fevereiro que o mercado de ações dos EUA tem vindo a registar uma volatilidade significativa, caindo quase 20% em relação aos máximos de fevereiro. Após 2 de abril e em apenas três sessões, apelidadas de “Liberation Day”1, evaporaram- -se 5,6 biliões de dólares de capitalização bolsista, o equivalente à Apple e à Nvidia. O anúncio de uma trégua tarifária de 90 dias foi o suficiente para inverter temporariamente a tendência, com o S&P 500 a registar a sua maior subida diária desde outubro de 2008 e a terceira maior em quase três décadas. Neste contexto, permanecem grandes incertezas alimentadas pela imprevisibilidade das decisões da administração Trump, o que é suscetível de prolongar um período de volatilidade estrutural. Perante esta falta de visibilidade, uma gestão mais defensiva parece ser, agora, a postura mais adequada. Embora não deixem de surgir oportunidades de investimento, assumir riscos apenas poderá ser adequado quando se tiverem dissipado os principais fatores de incerteza, nomeadamente a ameaça de recessão. 

CONFIANÇA, A CHAVE DO MUNDO DOS NEGÓCIOS 

Os riscos de recessão, tanto nos EUA como a nível mundial, estão claramente a aumentar. Apesar de não pensarmos que tal cenário seja iminente nos EUA, a persistência das incertezas políticas e a frequência das alterações estratégicas continuam a penalizar a confiança. A próxima época de publicação de resultados será decisiva para dar uma imagem mais clara do comportamento das empresas em termos de contratações e de investimento.

EMPRESAS NORTE-AMERICANAS 

O setor privado norte-americano faz-se ouvir com crescente intensidade nos debates públicos. Na sua carta anual aos acionistas, o CEO da JP Morgan, Jamie Dimon, expôs uma análise matizada da política tarifária de Trump, declarando: “A América em primeiro lugar é ótimo, desde que não se torne uma América isolada”. 

Também o investidor bilionário Stanley Druckenmiller manifestou a sua oposição a tarifas superiores a 10%, distanciando-se das políticas atuais. Até Ken Griffin, fundador da Citadel e grande doador do partido republicano, se referiu às medidas tarifárias como um “grande erro político”. Será que estas posições em sintonia influenciaram a reviravolta da administração Trump, apenas uma semana após o “Liberation Day”? A queda do S&P 500 para menos de 5.000 pontos e a súbita subida da taxa de rendibilidade das obrigações do Tesouro a 10 anos para 4,5% não faziam, provavelmente, parte do cenário original, se é que existia um. Donald Trump, através do seu Secretário do Tesouro, Scott Bessent, parece estar plenamente ciente da sensibilidade dos mercados aos custos do financiamento da dívida pública. Com 29 biliões de dólares de dívida em circulação e 9,6 biliões de dólares a refinanciar no corrente ano, uma subida duradoura das taxas de juro constituiria um risco evidente para a sustentabilidade orçamental. 

Desde há muito que os EUA beneficiavam do chamado “excecionalismo americano”, um privilégio que se inverteu em menos de dois meses. Enquanto a Europa e a China eram um tanto menosprezadas pelos investidores, os EUA continuavam a ser o destino preferido dos capitais de todo o mundo. Pensar que, hoje, a América se tornou num mercado não merecedor de investimento é revelador de uma visão de curto prazo. É fundamental não confundir as empresas norte- -americanas, símbolo de inovação tecnológica, crescimento da produtividade, espírito empresarial indomável, investimento sustentado e geração de lucros, com a atual administração dos EUA. Nesta edição, o nosso Chief Strategist para a Ásia analisa a forma como esta região poderá resistir ao impacto das taxas aduaneiras dos EUA. Desde há mais de uma década que a China tem vindo a desligar-se gradualmente dos EUA, o que lhe confere um certo grau de resiliência. Dispomos agora de 90 dias para criar uma nova ordem do comércio mundial.

1 - Em português: Dia da Libertação.

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Monthly House View, 17.04.2025. - Excerpt of the Editorial

30 abril 2025

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